Memória
de Infância
A minha infância foi
cheia de brincadeiras e a minha adolescência carregada de aventuras.
Escolhi uma
memória que me deixou grandes marcas na vida.
Estava um dia magnífico
de praia no Algarve, a família reunida.
Fui passear com os
meus três sobrinhos e o meu irmão à beira-mar e decidimos passar para outras
praias desconhecidas, pelas rochas, na maré baixa.
Que sítios
bonitos, repletos de conchas e pedras lindas!...
Hora de regressar,
a maré começa a subir e tive medo ir pelas rochas. Disse que ia por cima e eles
foram pelo mar.
Subi um morro e
verifiquei que me encontrava muito longe do local da nossa praia.
De biquíni e descalça começo a correr
em pleno asfalto quente (eram por volta das onze horas), os carros passavam e
apitavam…. ouvia os assobios dos trolhas nas obras.
Que calor e que
grande percurso tinha à minha frente, mas não desanimo!
Finalmente,
consigo chegar ao meu destino… cansada, queimada, com início de quebra de
açúcar e os pés queimados por baixo.
Quando chego ao
meu guarda-sol os meus pais perguntam pelo “resto do pessoal”. Não sei o que
responder, começo por pedir água e a ficar com receio que tenha acontecido
alguma coisa aos meus sobrinhos e irmão.
Olho para baixo e
vejo-os, fico feliz e, por fim, começo a contar a minha experiência. Ficam de
boca aberta!...
A minha mãe diz: -
Hoje não sais mais dessa toalha.
Ana
Machado, encarregada de educação
Memória
de infância
Prazer
de ler
Chegava
a casa da escola, muitas vezes depois de ter passado pela Biblioteca da
Gulbenkian.
A
Biblioteca ficava no centro da vila e eu tinha de fazer um desvio e andar para
trás no meu percurso de ida para casa. Era um edifício pombalino, com uma
grande sala repleta de estantes, onde a luz dos candeeiros emprestava um brilho
difuso e misterioso às lombadas dos livros cujos títulos esmaecidos me davam o
primeiro sinal para os escolher e levar comigo.
A
rotina de ir da escola para casa, passando pela Biblioteca, de quinze em quinze
dias, e o ritual que se seguia, acompanharam os meus oito, nove e dez anos. Mas
foram os outonos e invernos desses anos longínquos que ficaram gravados na
minha memória.
Chegava
a casa ao fim da tarde, às vezes quase de noite, e a casa estava vazia, os meus
pais ainda não tinham chegado do trabalho e o meu irmão estava na ama.
O ritual de acender o aquecedor a petróleo,
ficou para sempre gravado na minha memória. Retirava a mecha, embebia-a em
petróleo, acendia-a com um fósforo e, finalmente, colocava-a no receptáculo
próprio. Então, como que por magia, o aquecedor começava a sua função e a
cozinha ia, lentamente, aquecendo. Seguidamente colocava uma cafeteira com
água, na grelha superior do aquecedor. Quando começava a ferver, deitava para
dentro umas colheradas de cacau e de açúcar. Mexia energicamente e, antes de
retirar do calor, colocava uma pequena colher de manteiga. Voltava a mexer e
depois vertia numa caneca. Ia à pasta retirar um dos livros que trazia da
Biblioteca e sentava-me junto do aquecedor a ler e a beber o cacau quente.
Era
a felicidade suprema. A casa só para mim. O silêncio povoado pelas vozes das
personagens dos livros. O calor do pequeno aquecedor. O cacau quentinho e doce.
Ana
Paula Alves, professora bibliotecária
O Bolero de Ravel
Estávamos
no ano de 1982, tinha eu os meus dez anos.
O ano letivo havia terminado há poucos
dias, e eu conclui a minha quarta-classe com muito secesso.
Só
Alegrias!
No Colégio que eu frequentava desde
1978, já há alguns tempo tinham começado os preparativos para a nossa festa de
final de ano letivo, como acontecia todos os anos.
De setenta e três meninas que éramos,
todas participavam com os seus talentos, umas com teatros, outras com canções,
outras com música e seus instrumentos, outras recitavam poemas e ainda outras
com danças e bailados.
As danças, os bailados! O meu mundo!!
Como eu gostava de dançar, o meu
gosto e talento pela dança, fora ali descoberto, já o fazia desde os meus seis
anos de idade.
Esse ano, para mim, foi bastante
diferente dos outros, pois desta vez, eu iria dançar sozinha. Não em grupo como
acontecia sempre em anos anteriores, em que me sentia sempre especial, porque
estava sempre lá na frente, e por dançar tão bem, todas as meninas durante a
nossa atuação se guiavam um pouquinho por mim.
Mas esse ano, como disse, foi
diferente, foi especial, a menina Helena Margarida, que era assim conhecida no
meio de todas as setenta e três, foi ao palco sozinha na sua dança, e iria ter
uma menina das mais crescidas, a recitar de fundo um poema enquanto dançava.
Os ensaios já tinham começado há
algum tempo, tudo naquele dia, tinha que ser perfeito.
Com a aproximação da festa, a
ansiedade, o nervosismo miudinho se apoderavam de mim de vez em quando.
Mas
como acontecia todos os anos, tudo corria lindamente, todas nós brilhávamos!
O gosto pela dança era tanto que tudo
o resto ficava lá para trás, e tudo corria tão bem. E este ano não haveria
razão para ser diferente.
Este
ano, eu iria por breves minutos brilhar sozinha, e na minha dança.
Este
ano, a estrela seria eu e naquilo que já era uma paixão para mim, a Dança.
E
a menina mais crescida, iria brilhar no seu poema. A nossa atuação iria ser um
sucesso.
O nosso fato para a atuação já estava
pronto, e que lindos que eram, o meu era azul, azul como o mar.
O ensaio geral chegou, o dia do nosso espetáculo
estava mesmo aí e todas estávamos ansiosas com nossas atuações.
Os preparativos de montagem do palco, este
ano também eram diferentes e especiais, a festa iria ser feita num dos maiores
pátios que a nossa Quinta Amarela tinha. Todos os enredos assim o exigiam.
A montagem do palco este ano contava
com a ajuda de alguns dos nossos militares do Exército Português, estavam a
cumprir o serviço militar lá na Quinta, mesmo, e mais alguns que vieram do
Hospital Militar. Mas como este ano tudo era diferente, porque a Nossa Casa
estava também de aniversário, fazia 65 anos, teríamos que festejar esta data
tão bonita.
Como no pátio havia sempre o problema
do sol, pois o nosso querido público não poderia ficar uma tarde inteira
debaixo daquele sol, os nossos Paraquedistas Portugueses, vieram com três paraquedas
dos seus destemidos Saltos, e com a ajuda de pilares, os paraquedas serviriam
de toldos, uma espécie de guarda-sóis gigantes, resultado, sombra por todo o
pátio, onde iriam ser feitas as nossas atuações e onde iria estar o nosso tão
esperado público. Público esse, que eram os nossos familiares e amigos, e eram
muitos, e as famílias de Patentes Militares, desde os nossos militares mais
Rasos, aos nossos Majores, aos nossos Coronéis até à mais alta Patente Militar,
o nosso Tenente Coronel.
Todos estes olhos, iriam estar postos
nos meninas do Colégio da Quinta Amarela, o Lar dos Filhos dos Combatentes
(secção feminina).
E chegou o tão esperado dia, o dia 27
de Junho de 1982.
O dia nasceu com um sol radiante, adivinhava-se
um dia bonito de verão. E assim foi! Uma manhã bonita e muito atarefada, com os
últimos preparativos. Estava tudo a correr bem.
A nossa exposição de trabalhos de
Lavores de um ano inteiro deu abertura à nossa festa, estava linda! Trabalhos
maravilhosos, eram bordados de pontos magníficos, eram trabalhos em crochê
fantásticos, pinturas, lindos trabalhos os nossos!
A hora do espetáculo chegou, todo o nosso
público aguardava ansioso pelas nossas atuações.
Tinha
começado!
Teatros tão bonitos, de histórias de
encantar.
O Canto - o nosso coro cantou lindas
canções, neste dia todas pareciam rouxinóis a cantar no seu melhor, com
cantigas populares.
As lindas músicas tocadas por quem
mais tinha talento para seus instrumentos musicais.
As danças - o Rancho Folclórico, com
danças tão conhecidas como o nosso Malhão, as danças de ginástica rítmica, cada
grupo com seu Instrumento, umas com as Fitas, outras com as Massas, outras com
os Arcos e eu com a Bola.
Seguiam-se todas as atuações, uma
mais bonita do que a outra, todas estávamos a brilhar.
Finalmente, chegou a minha vez de
atuar de novo e Sozinha, o meu nervosismo antes de começar notava-se um pouco.
Mas mal o meu ato foi anunciado e a minha música começou a tocar, tudo isso
passou, desapareceu, estava ali para fazer o que tanto gostava, Dançar! E
durante aqueles 5 ou 6 minutos de música eu iria vivê-lo intensamente, eu iria
brilhar.
Eu ia dançar o Bolero de Ravel, onde
se ouvia de fundo um poema de Fernando Pessoa, o Poema “Mar Salgado”.
A minha apresentação iria ser feita,
dançando com uma rede, uma rede de pesca. Iria dançar um bailado de dança
contemporânea, tendo como fundo sonoro a leitura do poema que se ouviria pouco
depois.
À medida que a música ia avançando eu
dançava como se fosse o mar daquele poema, eu era aquela onda do mar, que dança
com o seu enrolar, eu era com todos os
meus movimentos, a onda que transforma o mar calmo numa tempestade, a onda que
enrola na areia, eu era aquela onda do mar, do mar de que tanto aquele Poema
falava. A leveza de cada movimento, a elegância de cada gesto, retratava aquele mar.
“Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.”
E assim termina, lentamente, como se
de uma tempestade se tratasse para a calma de um mar sereno.
Uma linda encenação feita através de
um bailado de dança contemporânea, um Mar bravio que acalma como se a tempestade
terminasse e começasse a bonança!
A minha atuação terminou!
Chegou ainda antes das primeiras
palmas, um Bravo, o reconhecimento de quem gostou muito do que acabara de ver,
as Palmas de todos, a minha emoção, o meu agradecimento,
O
meu Coração Cheio.
A minha memória de Infância retrata a
Alegria, a Felicidade de uma menina de dez anos. Aquilo que eu senti ao
conseguir passar uma mensagem com o meu bailado. Tinha-me sido dito, tu vais
ser uma onda do mar, tu vais ser o mar, e eu tinha conseguido ser tudo isso por
breves minutos.
E assim passou mais um dia de
felicidade da minha infância, que até aos dias de hoje, eu intitulei o dia do
Bolero de Ravel.
Helena Moutinho, encarregada de
educação
Memória
de Infância
A minha vida é
feita de escolas. Passei maior parte dos meus dias dentro de recintos
escolares. Desde muito pequena, quando acompanhava a minha mãe até aos dias de
hoje, por ser a profissão que escolhi.
As primeiras
memórias de infância que tenho são, lá está, relacionadas com escolas. Até aos
quatro anos de idade, a minha existência dividia-se em duas partes: quando a
minha avó passava temporadas em casa dos meus pais, ficava com ela por casa, a
ver as horas passar, brincando aqui e ali, abrindo livros e imaginando as
histórias que lá estavam guardadas e, se não tinha quem ficasse comigo,
acompanhava a minha mãe e passava o dia pela escola, enquanto ela dava aulas.
Devo dizer que,
apesar dos mimos da avó, sempre preferi ir com a minha mãe. Tinha vários
motivos para tal: porque tinha a companhia de muitas crianças, mais próximas da
minha idade e, mais importante ainda, porque, no regresso, tinha a oportunidade
de fazer uma das coisas que, ainda hoje, mais gosto: brincar com animais. Neste
caso, o Bobi. Gostava tanto, mas tanto, que, num dia em que fiquei em casa,
acordei, levantei-me, agarrei na minha chupeta e saí porta fora, sozinha, em
direção à paragem da camioneta, toda independente: queria ir ver o Bobi. Também
me recordo bem da palmada que o meu pai me deu. Felizmente, ainda usava
fraldas.
Eram outros tempos
e a minha mãe tinha de ir de camioneta até os arredores de Famalicão e, depois,
ainda tinha de caminhar cerca de 1 km até chegar à escola. Saíamos cedo, ainda
muito antes da hora do almoço e regressávamos já noite. Não era fácil,
especialmente no inverno. Mas, para quem queria muito brincar com o Bobi, os
obstáculos não eram muito difíceis. Em Arnoso, já meia freguesia conhecia a
menina que guardava metade do seu lanche para o Bobi.
O Bobi era o cão
de uma quinta, cujo portão de entrada ficava mesmo ao lado da paragem da
camioneta. Por volta das seis e um quarto da tarde, era ver o Bobi a abanar a
cauda, enquanto olhava em direção da escola. Quando surgia, lá ao longe, a menina
do pão, todo ele era alegria. Enquanto esperava que a camioneta chegasse, dividíamos
o pão e brincávamos.
Tive uma infância
feliz, brinquei muito, gostava da escola, o fim de semana era preenchido com
uma enorme família, estive sempre rodeada de gente boa, festas, amigos e, no
meio de tudo isto, a recordação que mais me enche o coração é a dos lanches com
o Bobi.
As coisas mais
importantes da vida não são coisas.
Sónia Pereira, encarregada de educação
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Sob a inspiração do tema do mar:
Olho, sem me cansar o
Mar
Azul ou com outras
tonalidades
Rebelde ou calmo.
Deixa-me sempre uma
Alegria
Mistura de sentimentos na
Infância
Nadar, saltar, brincar…
Horas e horas de magia
Alma e utopia
Inventar brincadeiras na
água
Nunca esquecer a
Força do mar
Ansiedade de
Namorar no embalar das
ondas…
Calmaria do nosso corpo
Imaginar novas aventuras
Atrás do MAR da fantasia
Ana Ribeiro, encarregada de
educação
O Mar
Ao
lado da minha casa
há
uma casa
onde
há pouco tempo
havia,
dentro dos seus muros,
uma
enorme floresta.
Os
soberbos eucaliptos antigos,
os
altos pinheiros,
entrelaçados
pelas selvagens madressilvas,
traziam
até mim
os
sussurros misteriosos de inefáveis bosques.
Aquela
mancha verde e escura
engolia
todas as vistas e perspetivas
possíveis
a partir do meu terraço.
Um
dia, outro dia e outro
vieram
máquinas em forma de formidáveis serras
e,
em silvos aflitos, todas as árvores
foram
cortadas. Também as madressilvas!
Mas,
para meu espanto e gáudio,
do
meu terraço, vejo agora
o
Mar!
Ana Paula Alves, professora
bibliotecária
O Mar da Minha
Meninice
Pensei, pensei
sobre o mar
Mas o mar, nada me
traz.
A memória é
traiçoeira
Só tenho
lembranças vãs.
Queria ser de novo
menina,
Para brincar com o
mar,
Sem medos, sem
receios,
Nele poder nadar.
Sonhar com baleias
e monstros,
Cavalos-marinhos,
estrelas-do-mar.
Medusas, algas e conchas.
Ouvir as sereias
cantar.
Mas o tempo
passou,
A menina cresceu.
E o medo ao mar
Sem ela querer,
venceu!
Estela
Laxmidas, assistente operacional (na Biblioteca Escolar)
O Mar
Hoje, dia 27 de Maio, domingo, por
volta das cinco horas da tarde, um dia bastante soalheiro, mas aqui à beira
mar, muito ventoso.
Um mar agitado com o vento soprando
de Norte, junto à praia Azul, logo ao lado da Capela do Sr. da Pedra e do Farol
da Boa Nova, em Leça da Palmeira.
O mar rebenta suas ondas nas rochas,
pois aqui tem muitas, entrando areia dentro precisamente nas pequenas praias.
À
minha esquerda, aí sim e até ao Porto de Leixões, temos areia e mar.
Olhando mais além, e na direção
da linha do horizonte, uma imensidão de Mar, onde consigo
ver uns três navios bem pequenos avistados desta distância.
Hoje como está mais ventoso, vemos
pequenas ondas brancas que se vão formando, que rapidamente desaparecem, muitas
mesmo em simultâneo, lembro-me que lhe chamam carneirinhos, tal como os
pequenos carneirinhos brancos.
Apesar desta agitação toda do mar,
mesmo assim, consigo sentir uma Paz, aquela Paz que com o corre-corre da vida,
às vezes não conseguimos sentir, aqui sim, a olhar esta paisagem tão linda, que
é o Mar, sinto sim, Paz.
Logo aqui ao lado, na praia de Leça,
consigo ver desportistas de parapente aquático, que aproveitam este mar e o
vento, hoje tudo a favor para este desporto, que o mar lhes proporciona, e que
bem que o fazem!
E aqui mesmo junto de mim, e como é
uma praia com rochas de um lado e do outro, o vento não atinge muito, tenho o
mar mais calmo, bem próprio para banhos, de quem aproveita o dia para a praia.
Voltando todo o meu olhar em redor e
em frente, esta imensidão de Mar do Oceano Atlântico, que banha toda a nossa
Maravilhosa Costa Portuguesa.
Helena
Moutinho, encarregada de educação
Recordo-me de olhar para
o mar infinito no horizonte,
que enchia o meu espírito
de tranquilidade.
Era um encontro comigo
mesma,
um momento em que eu
perdia a noção do tempo e do mundo à minha volta.
O mergulho nas águas
refrescantes revitalizava o meu ser,
eram momentos únicos.
Regressava à toalha e
refletia como era possível tantas crianças nunca o
tinham visto.
Se me tivesse acontecido
a mim,
o meu eu nunca poderia
existir.
Pensava como seriam as
águas quentes do sul,
a minha amiga dizia que
era muito, muito longe.
Será que um dia eu
conseguiria lá ir?
Sim, um dia eu iria
conseguir ver esse mar quente,
mas era um pouco
assustador,
pois era muito, muito
longe, num sítio desconhecido.
Mas um dia eu iria sentir
o mar quente...
Seria também infinito?
Um dia eu iria saber.
Sónia Valente, encarregada de
educação
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À maneira de Clarice Lispector:
À maneira de Clarice
Lispector, Perto do Coração Selvagem...
A
tia. Os braços gordos e macilentos sempre prontos para abraçar Joana. E aqueles
dedos em posição de estalactites, de uma humidade viscosa a tocarem-na
constantemente! Que dias tão opacamente iguais! Onde estava a memória do pai?
Como se fosse possível trazer até àquela casa, cheia do corpo da tia, dos
braços abertos da tia, dos objetos sem sentido da tia, o riso fresco do pai,
ingénuo e esperançoso. Ou os seus braços compridos e ágeis com que tantas vezes
a levantara e ela sentia então tocar o inatingível. Ou a madeixa negra que
teimosamente se espreguiçava sobre os olhos.
Algumas
vezes estas imagens gravadas no mais fundo de si, chocavam umas contra as
outras e o que Joana via era um emaranhado de dentes, de braços e de cabelos
que a sufocavam numa vertigem aguda.
A
tia tinha preparado um almoço mimoso para a alegrar – galinha guisada com
batatas – uma galinha de cor castanha dourada, tão feliz a debicar minhocas e
outras porcarias, na companhia das outras galinhas, isto antes de ser roubada à
liberdade e à vida, antes de aparecer cortada em bocados e regada com um molho
espesso e escuro, mesmo ali à sua frente, na travessa larga e redonda. As
galinhas não se matam e, muito menos, se comem. A tia não sabia? Ah!, tantas
coisas para ensinar àquela tia gorducha e ignorante. Ela e o pai é que sabiam!
Nunca comiam galinha.
Ana
Paula Alves, professora bibliotecária
|
Autoria de Estela Laxmidas, assistente operacional na Biblioteca Escolar |
Escrever à maneira
de Clarice Lispector...
Paz, hum… esse
sentimento ilusionista, que me leva a pensar que tudo à minha volta cheira a
felicidade, prazer e euforia e não é que então, num leve bafo, num pequeno
salto catastrófico, como se, sem pensar nem dar conta, desse um saltinho e me
visse a cair do cimo de uma ponte, tudo se torna num enorme desespero cortante,
mutilador onde sinto o sangue que me corre nas veias prestes a derramar-se por
todo o meu corpo.
Aqui estou eu, no
silêncio merecido do meu quarto, onde o único som que me envolve é o som do
vento que faz voar e rodopiar as folhas em várias direções e empurra os ramos
do misterioso limoeiro, que nasceu ao lado da janela do meu quarto sem eu saber
como, só sei que não fui eu, contra a janela, como se pedissem autorização para
entrar.
Depois de um ano
inteiro de trabalho árduo, sufocante, como se trabalhasse debaixo de água e só
viesse à tona para respirar, que me consumiu a alma, a energia e a carne
deixando-me só o esqueleto de algo que já fora alguém, posso finalmente carregar
a bateria e deliciar-me com esta paz silenciosa e tão transcendental que se
infiltrou pelas minhas narinas e se apoderou do meu eu.
Toca o telefone,
atendo e, de repente, eu já não sou eu, entrego-me ao corpo de um homem, que
toda a sua vida sofreu de humilhação, traição, rejeição e à insignificância que
ele próprio se deixou ser. Um homem com um coração maior que o mundo, um homem
que se conhecesse a sua própria essência seria tão grande que todos os outros
se sentiriam meras formigas perto dele.
Sinto-me livre,
finalmente posso voar, assinei os papéis que tanto pavor, angústia e desespero
me causaram, mas afinal, agora sinto paz, sinto que tudo posso.
Pela primeira vez
na vida sinto-me grande, consegui quebrar as correntes enferrujadas e já cheias
de lodo, cresceram-me asas, posso voar.
Agora, vou fazer
aquilo que sempre me deu prazer, ajudar e passear. Já coloquei no saco tudo o
que a minha vizinha me pediu e enquanto me dirijo para casa, vou pelo passeio e
apercebo-me que durante todos estes anos nunca tinha dado atenção ao som
maravilhoso dos pássaros, as árvores estão carregadas de ninhos escondidos
entre a folhagem e o canto deles é algo de outro mundo. As pessoas são
simpáticas comigo e eu sinto-me radiante.
Estou quase a
chegar, mas vejo uma senhora a conduzir um carro completamente descontrolado e
quando me apercebo tenho as pernas completamente esmagadas, o meu sangue pintou
tudo ao meu redor e a dor, o pânico e o desespero tomaram conta de mim.
A paz ilusória,
mentirosa, maldita, tornou-se tão amarga.
Espera, a dor
desapareceu, não sinto nada… não tenho medo, estou em paz outra vez.
Não, não é
possível. Que paz estranha é esta?
Ah… acho que
acabou, acabou tudo.
Acho que
morri!
Filipa Remelgado, encarregada de
educação
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Publicado em 28/7/2020
Primavera
No fim do inverno
Veio o cheiro do mar
O florescer das flores
A cor, o brilho, o pomar.
Cheia de alegria
Veio a cantar
Com um sorriso único
Único como sonhar.
O canto dos pássaros
A cor da natureza
Vem deslumbrante e ardente,
a esplêndida Primavera.
Bruna Oliveira, 9.ºA
Primavera
A Primavera voltou
E com um sorriso a recebemos
Consigo regressou a alegria e a harmonia
E a frescura dos ventos.
O canto das aves
Desperta-me todos os dias,
Os campos encheram-se de flores novamente.
Isto é a Primavera!
Estação que deixa toda a gente contente!
Diogo Garcia, 9ºA
Vivemos num mundo desatinado
Assombrou-nos uma pandemia
e por tempo indeterminado
a perda da liberdade era o que temia.
Chegou a primavera
Com um sorriso veio mais cedo
em casa num tempo de espera
sem puder sair por medo.
O céu abriu, as flores nasceram
fazer um piquenique era irresistível
as andorinhas mais cedo vieram
o canto lá fora era reconhecível.
Acabou-se a "prisão"
para a nossa alegria
e mesmo com máscara de proteção,
eu ainda sorria.
Fabiana Rodrigues, 9.ºA
Primavera
Lá vem ela, a nossa amiga primavera.
Com ela a alegria de ver o sol nascer.
O azul do céu e o amarelo das flores.
Lá vem ela, com o canto das andorinhas,
Que encantam o sorriso do filho da vizinha.
Lá vem ela, a primavera.
Quando ela chega, eu vou passear com ela.
Francisco Camilo, 9.ºA
Na primavera o
amor acontece
No peito um sorriso do coração,
Provocado pela sua enorme euforia,
Enfim, acabou qualquer espera,
O amor tinha vindo com a primavera.
Tantos jardins floridos com delicadeza,
Assim é a nossa bela natureza,
Que se transforma com altivez,
Movimentando sentimentos com lucidez.
O amor nasce e as flores florescem,
O canto dos pássaros enche coração,
Viajando pelos sonhos de esperança,
Transformando a vida e dando confiança.
Na ternura de uma flor se descobre o amor,
Oferecendo aos sentimentos uma nova cor.
Isabel Gomes, 9.ªA
A Primavera
A primavera e o seu canto
De alegria no coração balança.
O sol aparece
Um enorme sorriso no rosto cresce
Com as suas flores dá vida e cor
Até à mais pequenina flor.
Jéssica Arouca, 9.ºA
PRIMAVERA
A
Primavera está aqui,
No
ar,
Podemos
sentir o cheiro a chegar,
Nas
árvores,
As
folhas são verdes,
Lagartas
apanham sol com alegria,
Os
pássaros estão de volta,
Com
um canto de espantar,
A
relva lá fora e a flor a brotar,
E
abelhas ocupadas a trabalhar,
Nas
árvores,
As
folhas são verdes,
Lagartas
apanham sol com alegria,
Arrancando
um sorriso ao meu dia.
Lara
Dias, 9.ºA
Primavera
A
Primavera tão doce
Como o
sorriso dela
Tão dócil,
tão frágil
O cheiro de
flor com o perfume
Que ela
carrega consigo.
O canto da
primavera
Tão alegre
quanto ela,
Tão
sorridente, tão apaixonante, tão ardente, tão cega,
Mas, como
todas as coisas boas,
acaba e
nunca mais volta!
Márcio Bessa, 9.ºA
Primavera
A estação da Primavera
Dá-me um sorriso de alegria
Acordar com o canto dos pássaros
Como se vivesse num campo
É uma sensação fantástica.
Borboletas a esvoaçar
Pelo formoso céu azul.
Tardes com algum calor,
Para dar longos passeios
Nos verdes jardins em flor.
Tatiana Ferreira, 9.ºA
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Publicado
em 17/7/2020